Com os pés no Rio Grande, Thchê!
Cruzamos a fronteira entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul de balsa pelo Rio Uruguai, e sem custo nenhum. Mas precisamos passar por uma revista do exército, que estava a realizar alguma operação anti-drogas que não ficamos sabendo, pois não assistimos televisão. Na verdade a tal revista foi ver nossos RG’s e aproveitar a deixa para curiosar o de sempre “deondevempraondevaiquantosquilômetrosequandochove?”. Na estrada até Vista Gaúcha alguns caminhões cheios dos verdinhos passaram pela gente com muita simpatia, sempre reduzindo a velocidade e acenando.
Os primeiros quilômetros no território gaúcho ainda foram de muitas montanhas para subir e descer, e paisagens ainda muito parecidas com as do oeste catarinense. Aos poucos, a paisagem montanhosa e verde escura foi dando lugar a pequenas colinas quase planas de cor verde clara e cor de areia, dêem as boas vindas às lavouras, os desertos verdes que servem para alimentar esses seres herbívoros. Não, eu não estou falando dos vegetarianos e veganos comedores de soja, estou falando dos cavalos de corrida, do gado e de todos os animais que servem ao homem como fontes de prazer ao paladar e ao lazer de muitos apostadores. Ficamos muito indignados ao saber que os cavalos de raça, cujos donos os usam para corridas de aposta, são tratados a aveia e alfafa, comida que nós mal conseguimos comprar de tão cara nos supermercados. Ao ver tanta lavoura eu ficava me perguntando “Será que existe tanta gente assim pra comer tanta aveia?!” é claro que não, “You idiot”! Essa aveiarada toda é pros cavalinhos de corrida, e outros animais criados para engorda e abate. Não tem nada mais desprazeroso do que pedalar quilômetros e quilômetros debaixo do sol, numa rodovia cercada de lavouras sendo pulverizadas de veneno a todo instante, sem nenhum refúgio de sombra ao longo da estrada a não ser uns poucos pontos de ônibus em uma vilazinha ou na frente de alguma mega empresa cerealista. Sabe o que é precisar fazer xixi e não encontrar nenhum matinho pra se esconder? Pois é, aí você torce pra não passar ninguém enquanto você tiver com as calças abaixadas.
Desde Tenente Portela até São Miguel das Missões a paisagem tem sido lavoura. Ao menos até chegarmos em Ijuí os acostamentos eram pedaláveis e o movimento, comparando com a BR que pegamos em seguida, até que pequeno. Neste trecho batemos o recorde de animais exóticos abatidos nas estradas. Conta comigo: vários cães do mato, um gato do mato ainda quente, um tamanduá já inflando, um pássaro de bico fino e longo de grande porte que não conseguimos identificar, um tatu, uma lebre, um surucuá, além dos costumeiros gambás, passarinhos, pombinhas, cães e gatos domésticos.
Passamos alguns apuros para encontrar um local para pernoitarmos em Ijuí, apesar da cidade ter mais de 7 CTG’s (todos pareciam estar em festa, sábado a noite sabe como é), fomos parar no pátio da Polícia Rodoviária Federal após outro recorde, mais de 80km pedalados no dia. Para alegrar o dia de sofrimento, ganhamos um pão de milho numa padaria da cidade, pois o padeiro foi com a nossa cara e quis nos presentear. Foi a sorte do dia seguinte, pois domingo era dia dos pais e estava difícil encontrar mercadinhos abertos pelas pequenas cidades ao longo da BR-285. Já caindo a tarde o acostamento começa a piorar pra valer, e estava sendo preciso empurrar até mesmo na descida. Essa tensão aliada ao movimento da data comemorativa deixava nossa moral ainda mais baixa, e parecia não haver lugar propício para passarmos a noite. Mas como esperávamos um final feliz, lá no topo da montanha tinha uma Igrejinha e uma cancha de bocha coberta. A pequena colina parecia o Evereste e não chegava nunca, empurra e empurra.
Armamos acampamento sem pedir autorização e sem avisar ninguém, estávamos tão cansados que não tínhamos humor para procurar os vizinhos e conversar. Só queríamos saber de um belo banho de caneca, janta e saco de dormir. Mas eis que, nem tudo são flores num dia tão lindo. E lá pelas 23h, já nos idos do sono profundo, o barulho das telhas de zinco batendo anunciaram um desastre que felizmente não aconteceu. A estrutura do local parecia balançar com o vento, mas graças à chuva que logo ca