Pedalando o Salar de Uyuni
Depois da rota das Lagunas chegamos a San Juan de Rosário, nossa porta de entrada para a superfície de sal mais extensa do mundo. Entramos no Salar de Uyuni nas proximidades de ColchaK, passando pelo povoado de Puerto Chivica e acampamos aí no tapete branco.
Nesta época o clima é supostamente seco, mas nas duas noites que acampamos no salar pegamos neve e chuva. Pedalamos um dia inteiro com horizonte branco pelas nuvens que escondiam o céu azul, e branco sobre nossas rodas, o SAL!
Um dia frio, nenhuma cor, parecia que pedalávamos em outro planeta ou num cenário de filme, sabe aqueles com fundo infinito?! Nos guiamos por manchas de urina deixadas pelos turistas que viajam com tours, não há muito onde se esconder por aqui, então qualquer um faz em qualquer lugar. Mas foi providencial ter as manchas de xixi porque as trilhas dos carros não estavam aparentes e o Vulcão Tununpa estava escondido pelo mal tempo.
Ainda bem que nossa bússola estranhamente estava funcionando no salar, só para nos certificar de que o xixi vinha da direção certa, a Ilha Incahuasi. Mas ficou aquela dúvida se não estaríamos realmente dentro do show de Truman…
Depois desta experiência única de pedalar num deserto branco, e já cansados de tantas fotos de perspectiva forçada, chegamos novamente debaixo de chuva ao povoado de Tahua, onde avistamos o primeiro grande grupo de Cholitas e Cholitos a usar suas coloridas e peculiares mochilas feitas com uma trouxa de tecido, desciam de um ônibus carregado até o teto.
Depois da rota das Lagunas, o rípio ao norte dali pode ser considerado excelente. Chegamos a Huari pensando que poderíamos sacar dinheiro, chegamos cedo com a ideia de sacar dinheiro e pegar alguma hospedagem barata só pra poder tomar um banho (o último tinha sido lá em San Pedro de Atacama, no Chile). Mesmo tendo perguntado para várias pessoas em diferentes cidadezinhas, todas nos disseram que haviam bancos em Huari e Challapata. Realmente existem, mas não há caixas automáticos!
Ficamos sem dinheiro e sem poder comprar comida, aí se compadeceu da gente o segurança do banco, ele foi até sua casa e buscou pães pra gente, depois nos chamou de novo e nos deu uma garrafa de refrigerante.
Quem pensa num bom banho depois de ver nos olhos de alguém a emoção em ajudar dois desconhecidos forasteiros? É dessas coisas que uma viagem assim faz valer a pena. Não somente sentir as dificuldades e desfrutar paisagens, mas saber que seja o lugar que for, vamos nos deparar com pessoas boas, de enorme coração, que não medem esforços para ajudar, que nos emocionam também e mechem profundamente com o nosso ser, nos modificam, nos ensinam.
Os pães e o refrigerante laranjado foram Fanta-ásticos, nos salvaram de algumas horas de pedal, açúcar e carboidrato, era tudo o que a gente precisava. Tivemos que apurar o passo para a nossa comida aguentar mais dois dias de pedal até Oruro, seriam mais de 90km por dia e tínhamos $40 bolivianos para alguma emergência, dois pacotes de bolacha e um pouco de arroz para a janta, ainda conseguimos comprar umas bananas e tomates por menos de $10 bolivianos antes de sair de Challapata.
Dois dias de pedal forçando o ritmo, contra o vento, contra o frio, pedalando até a noite chegar, acampando na beira da estrada sem ligar muito se estávamos escondidos ou não. Não tínhamos opção, a comida chegava ao fim. Chegamos em Oruro com as bolsas de comida vazias!
- Depois de uma noite gelada, a superfície dos sacos de dormir amanheceram congeladas. Então deixamos arejar e descongelar ao sol da manhã enquanto guardávamos o resto do equipamento.