S.A.los Cobres a Paso Sico #fail
Saímos empolgados e com muita comida comprada neste povoado peculiar. Troca de dinheiro argentino para chileno, todos pesados de mantimentos e água. Acabamos saindo tarde demais e o vento nos pegou depois da curva. Tempestades de areia e rípio ruim, muita areia solta, um dia em que os locais nos alertaram que a puna veio mais forte. O resultado, paramos mais cedo do que o esperado, antes de subir o paso de 4600 metros. Se seguíssemos iríamos nos cagar de frio à noite lá em cima, além do mais ficar lutando com o vento de fim de tarde, quando na manhã seguinte poderíamos sair mais cedo, sem tanto vento, subida acima.
Nos acolheu um senhor idoso, no auge dos seus 80 anos, com a boca toda verde de folhas de coca e os olhos brilhantes, típicos daquele tipo de pessoa que apesar das dificuldades em que vive, tem vivacidade e sobretudo solidariedade.
Em toda sua simplicidade nos recebeu amistosamente, nos cedendo seu pátio protegido do vento e ainda nos oferecendo seus pães, recém feitos no forno à lenha, havia preparado para seus filhos que estavam no campo longe, cuidando do rebanho de llamas e ovelhas. Mas seu grande coração não o impediu de nos oferecê-los. Provamos o pão amassado à mão, tostadinho de fogo, e para agradecer-lhe a generosidade, copramos todos alguns pães para a viagem no dia seguinte.
A Subida aos 4600 metros, em Alto Chorrillos foi a subida mais difícil que já enfrentamos. O vento apareceu logo cedo, e a falta de ar e força causada pela altitude tornou aqueles 12km um suplício. Tentávamos pedalar, em vão.
Era frustrante ver a subida nada íngreme um obstáculo instransponível sobre o selim, todos empurrávamos ofegantes as bicicletas morro acima, se conversávamos um pouco uns com os outros, pagávamos o preço, parando ofegantes algumas palavras adiante. Não conseguimos chegar no mesmo dia a Olacapato, e fizemos apenas 20km.
Paramos pernoitar em uma ruína em Toconal e na manhã seguinte desconbrimos que ali fora uma antiga terma, água quente brotava da terra ao lado de fontes de água congelada. Aproveitamos para lavar a cabeça, e enquanto penteáva o cabelo, a água da cabeça congelou, deixando o pente cheio de gelo e o cabelo todo espetado e duro de gelo. Seguimos a Olacapato onde conseguimos encontrar alguns vegetais com a Dona Rosa, que prontamente preparou uns pães para todos levarmos adiante. Neste dia acampamos dentro de uma igrejinha em Cauchari, local cheio de ruínas, apenas a 8km do povoado de Olacapato.
No dia seguinte o casal brasileiro seguia para o passo Jama por meio do Salar de Cauchari, e nós mais o casal argentino seguiríamos a Catua, para no dia seguinte ir até a aduana do Paso de Sico. Mas o destino não quis facilitar as coisas e desde a manhãzinha o céu não estava de brincadeira.
Ao começarmos a subir, começou a nevar, e assim foi o dia todo, uma lenta e densa neve que decorou nosso caminho. O problema foi quando começou a descida até Catua. Descer com o corpo esfriando, nos agasalhamos mas não foi o suficiente.
Descer significa perder altitude e a temperatura aumenta, deixando a neve virar chuva, esfriando ainda mais o corpo. Chegamos em Catua trincando os dentes debaixo de uma chuva que logo virou neve outra vez com o cair da tarde. Muitas crianças jogavam bola na quadra da praça central, todas molhadas e com suas bochechas vermelhas.
Não estávamos em condições de acampar, e buscamos única hospedagem do local, administrada pela comissão aborígene. Nos deixaram ficar, mas não havia ducha, muito menos água quente. A energia elétrica só existe das 15h as 24h, mas as camas eram confortáveis e os cobertores muito quentes, o que seria sufciente para descansarmos deste dia difícil. Na manhã seguinte não conseguimos partir.
Primeiro porque trouxeram até nós a notícia do passo fechado, e segundo porque nossas roupas todas permaneciam molhadas, e para enfrentar o vento que fazia la fora, precisaríamos de toda nossa roupa seca, sob o risco de passar muito frio. Estávamos ferrados! Nosso dinheiro argentino tinha acabado e ninguém ali trocava pesos chilenos.
Nossa salvação foi que o casal argentino ainda tinha dólares e conseguiram trocar com boa taxa com um rapaz do povoado. Com isso conseguíamos comprar comida e ficar mais uma noite na hospedagem.
Ficamos mais um dia. Nesta tarde chegaram ao povoado o casal de ciclistas da Nova Zelandia, nos seus 50 e poucos anos de muita vitalidade, fizeram em 2 dias o que nos levou 4. Partiram cedíssimo no dia seguinte, mas não lograram fazer o passo, os encontramos pegando carona com uma caminhonete que voltava da aduana. Mesmo assim nós seguimos até a fronteira para nos certificarmos de que o passo estaria fechado mesmo, e talvez esperar um ou dois dias por lá. Não queríamos fazer o passo de Jama.
Nos recebem policiais aduaneiros vestindo suas pantufas dentro do enorme prédio com calefação, televisão à cabo e Wifi, nos proibindo terminantemente de seguir. Afirmavam que o passo estava coberto de neve, que precisavam aguardar o lado chileno liberar a pista, e que caso alguém seguisse e tivesse problemas, não contavam com veículos de resgate. Decidimos pernoitar ali e esperar até o dia seguinte para nos decidirmos.
Nos convidaram a dormir dentro do prédio. No dia seguinte não tivemos nenhuma novidade. Ambos os passos continuavam fechados, era inútil seguir ao outro passo se a condição dele era a mesma deste. Só fomos decidir seguir ao Jama quando nos confirmaram que este estava aberto, e que o de Sico não receberia o maquinário para a limpeza e poderia permanecer semanas e meses fechado.
Voltamos ao povoado de Catua para tentar uma carona até o asfalto. Mas não conseguimos nada. Então o jeito foi pernoitar ali outra vez, e seguir no dia seguinte. Desta vez não tínhamos mais dinheiro para hospedagem, e um senhor nos cedeu um cõmodo de sua casa em construção, tínhamos até televisão por satélite. E assim nossa empreitada de seguir ao paso de Sico falhou.