Turistando em El Chaltén
Depois de dois dias “Into the wild” chegamos a El Chalten. Nos decepcionamos com os preços de comida e hospedagem e nem o Fitz Roy pra ajudar um pouco, ficou lá escondido feito um covarde atrás das nuvens. Decidimos que se quiséssemos ficar na cidade teríamos que deixar as bicicletas em algum lugar seguro e subir acampar nos campings livres do Parque Los Glaciares. Qualquer birosca queria nos cobrar pra “guardar” as bicicletas ao relento em quintais sem cercas ou muros. Tivemos que recorrer aos bombeiros.
Lá nos deram a autorização para deixar as bicicletas. Eram 16h e pretendíamos subir ao acampamento Capri, o mais próximo dali. Ainda teríamos até pelo menos as 21h de luz clara pra subir com as mochilas carregadas. Mas o bombeiro simpatizou conosco, nos disse que o genro dele é brasileiro, e nos convidou a ficar no abrigo dos bombeiros. Então decidimos ficar ali, com todo o luxo de camas e banho quente. Até aquecedores haviam. Então no dia seguinte pela manhã partimos rumo ao camping livre perto do Cerro Torre.
Fizemos de conta que éramos trekkers experientes e caminhamos sem os incríveis bastões de caminhada com nossas mochiladas carregadas com as bugigangas mais indispensáveis. Os outros trekkers, mesmo sem peso estavam todos fazendo tec-tec pela trilha, com os tais bastõezinhos acompanhando os passos nas trilhas bem marcadas e sinalizadas, perfeitamente seguras, do Parque Los Glaciares.
No meio da trilha, ouvimos vozes familiares. Sem combinar nem marcar nada, lá estavam Marco e Ellen outra vez, desta vez sem breteles, à paisana como nós. Subimos ao mirador do Cerro Torre. Mas eu, Ana, desisti pelo meio do caminho e fiquei guardando as mochilas e apreciando a vista do laguinho, porque nada do Cerro Torre sair detrás das nuvens. Essas montanhas são muito excêntricas e tímidas, sempre se escondendo atrás de alguma nuvem moderninha que teima em aparecer em todas as fotos de turistas que passem por ali, umas fanfarronas exibicionistas, é isso que estas nuvens são!
Nossos amigos voltaram entristecidos por ter conseguido ver a bola de sorvete sobre o Cerro Torre por apenas alguns segundos, e somente por detrás de uma fina cortina de névoa. Nós levantamos acampamento junto com um monte de outras barracas muilticoloridas notavelmente extrangeiras, no intento de abrir nossos sacos de dormir quentinhos em plena 5h da matina pra talvez ter uma chance de ver o amanhecer alaranjado na montanha em forma de agulha com uma bola de sorvete que parece um cogumelo no topo. E felizmente conseguimos. Parece que até as 7 e 15 da manhã as nuvens exibicionistas estavam dormindo em formato de orvalho ou gelo, então o Torre não podia fazer nada a respeito, e se contentou em ficar exposto às criticas dos olhos humanos, cliques e flashes fotográficos.
No dia seguinte seguimos rumo às Lagunas Madre e hija, para finalmente descansar nossos corpos no campamento Poincenot, com vista para o Fitz, que já nos esperava semi-desnudo de nuvens, um fofo! Armamos nossa carpinha, eu, Ana, tratei de ficar mal de coisas de todo mês e não aproveitei quase nada. Fiquei o dia seguinte inteiro dentro da barraca enquanto nevava lá fora. O André pegou uns lanchinhos e a câmera e foi sozinho ao Glaciar Piedras Blancas e à Laguna de los Tres e a laguna escondida também. Estava nevando por lá, em pleno 23 de dezembro. Ele gravou um relato em vídeo pra me mostrar. Queria tanto ter ido até lá!
Depois de 3 noites nas montanhas, descemos à civilização turística. Fomos aos bombeiros retirar as bicicletas torcendo para que nos convidassem a ficar mais uma noite. Mas era outro bombeiro de plantão e ele não deixou que ficássemos. Então o jeito foi ir para o camping privado mais caro que já ficamos, e olha que era o mais barato da cidade! Não tinha wifi e não podia cozinhar nada muito cheiroso na cozinha comum, só macarrão e ferver alguma água (o que diga-se de passagem não é nada que um fogareiro de mochila não faça), então não havia nenhuma vantagem em ficar ali a não ser pela energia elétrica pra recarregar toda tranqueira teconológica dispensável à sobrevivência, mas não indispensável para dias mais confortáveis na estrada. Afinal são coisas que nos fazem sentir mais perto de uma vida como se estivéssemos no conforto do lar e não numa beira de estrada como forasteiros ignorados pelos transeuntes.
Dia seguinte amanhece feio outra vez, mas sem nenhum vento. Saímos só depois do meio dia e no caminho do camping até a placa de boas vindas ouvimos um punhado de gente falando português brasileiro. É, somos uma praga e estamos em todos os lugares. Em qualquer lugar mais ou menos turisticozinho que estivemos o pessoal sempre comentava que é cheio de brasileiros. Saímos de lá sem dizer tchau pro Fitz, fica pra outra vez né Fitz? Nos vemos ainda, até logo!